Foi com grande e renovado interesse
que acompanhei o que aconteceu nesta última semana no panorama nacional. Uma
das situações que me chamou a atenção foi o facto de o governo decidir apoiar a
comunicação social (CS) portuguesa, com o objetivo de preservá-la forte,
robusta e preparada para prestar informação, formar e entreter os cidadãos,
escrutinando os poderes públicos (palavras do documento da presidência de
ministros).
Decidiu o governo, então, fazê-lo
sob a forma de compra antecipada de publicidade institucional aos meios de
comunicação, num investimento situado nos 15 milhões de euros, alocando 75%
destes aos órgãos de âmbito nacional e os restantes 25% aos de âmbito regional (clique para ver documento).
Pois bem, a mensagem e a ideia parecem atrativas e bem-intencionadas, mas
porque é que esta medida se traduziu em algo mais dúbio do que se fazia prever?
Isto teve essencialmente que ver
com a forma como esta medida foi realizada, pela forma como o os apoios
chegaram, assim como pelos valores atribuídos às diferentes organizações (e
mais um ou outro acontecimento estranho à mistura). Os tais 11 milhões e 250
mil euros (75% do total) que seriam distribuídos pelos meios de comunicação de
âmbito nacional foram direcionados, para os meios de comunicação elegíveis, sem
uma fórmula explicita e fácil de entender, forçando os contribuintes a ter de
magicar umas contas matemáticas (dignas de um doutoramento em física quântica) para
conseguir encontrar um match entre valores e contas, que nem no Tinder
era possível dar certo. Sem saber a explicação da distribuição do montante
total pelas empresas, fica no ar a ideia da justiça dos valores e da
distribuição justa destes milhões de ajuda estatal. Já surgiram algumas críticas
nesse sentido, mas até ao momento não se pronunciou ninguém do governo.
Aliada a essa confusão surge a
forma como os apoios chegaram. A CS deve ser independente e imparcial, assim
como autónoma e sem ligações ao Estado que ponham em causa a sua integridade. Esta
ajuda do governo pela forma de compra antecipada de publicidade institucional
surge como uma nuvem negra sobre os órgãos de jornalismo portugueses. Claro que
devemos confiar no Estado e na comunicação social preservando, até prova em
contrário, a sua idoneidade. Mas tudo isto cheira a esturro, e faz com que
algumas pessoas torçam o nariz e que apontem o dedo ao Estado e à CS pelas demasiadas
coincidências que vão surgindo contra a integridade dos mesmos. Os apoios
podiam ser concedidos de outras formas. Por exemplo o Estado ajudar a população
a comprar assinaturas de jornais à sua escolha, entre outras. Mas nada de que
se parecesse com injeção de dinheiro nas organizações. Para juntar tudo num
cozido à portuguesa fabuloso, Rui Rio faz um tweet algo populista, mas que
mesmo assim não lhe falta a razão (clique para ver tweet). Rio escreveu que “15 milhões de euros de
impostos” seriam “para ajudar a pagar os programas da manhã e o Big Brother”,
o que à partida parece um argumento para fazer levantar burburinho, mas que é
um argumento válido e importante. Na realidade nós, contribuintes, não sabemos
se aquele dinheiro do “apoio” será alocado na vertente de informação ou na de
entretenimento. E eu cá não quero ver o meu dinheiro a ser investido nos reality
shows desta vida… Se for investido na informação considero bem empregue,
caso contrário fui enganado!
E ainda alguns acontecimentos
estranhos encobriram o céu dos meios de comunicação, transformando um cenário
cinzento num monte de nuvens negras carregadinhas de chuva, prontas a
descarregar tudo o que tinham guardado. Alguns despedimentos aconteceram nas
organizações que receberam os apoios do Estado (chamemos-lhe apoios…), exemplos
disso são o João Quadros (Jornal de Notícias) e o André Ventura (Correio da
Manhã). Ainda hoje não quero acreditar que estes despedimentos têm algo que ver
com a compra antecipada de publicidade institucional (pronto, desta vez já não
lhes chamei apoios), e quero preservar, na minha cabeça, a ideia de que o
sistema não está tão corrompido quanto se parece. Quero acreditar que estou a ver
algo distorcido, assim como quem vê de longe uma paisagem, mas sem óculos. Contudo,
mesmo sem óculos, eu ainda vejo alguma coisa…
Espero mesmo que a confiança que é
depositada por nós, portugueses, nos meios de CS não seja traída ou atraiçoada.
Todos devem ter uma voz, todas as opiniões merecem ser ouvidas, e nós merecemos
liberdade de expressão para todos (até para os deputados que gostam de comentar
coisitas do futebol nos canais foleiros e mesquinhos). E nós, acima de tudo,
merecemos uma informação limpa, imparcial e isenta!
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