Numa
semana onde se derrubaram estátuas por muitos lados, também se derrubaram
ministros no executivo de António Costa. Por aqui, fazendo lembrar um bom jogo
de futebol (que já não se vê no nosso país faz alguns longos meses), houve uma
substituição na equipa portuguesa 2019-2023, de onde saiu um “Ronaldo” e entrou
um Leão. Foi uma semana curta, com fim-de-semana prolongado para muitos, mas a
política não deu tréguas. Vamos a mais uma análise semanal!
A
notícia caiu com estrondo na passada terça-feira, quando o mestre da
recuperação financeira e orçamental do período 2015-2019, o Ministro das
Finanças Mário Centeno, anunciava a sua retirada do governo em plena crise
económica “pós-pandemia” (clique para ver artigo). Não é que a sua saída fosse
um acontecimento imprevisível e que apanhasse alguém de surpresa (clique para ver artigo), mas o momento/ timing não era o que se queria de todo. Já se sabia
que, o agora ex-ministro, namorava o cargo de Governador do Banco de Portugal. É
um lugar que lhe encaixa bem dadas as suas competências e qualidades e Centeno
já lhe piscava o olho há algum tempo. Ultimamente não só lhe piscava o olho
como já lhe pagava bebidas e jantares (clique para ver artigo), e notava-se bem
que Centeno queria e quer consumar essa relação o quanto antes! Mas, antes de
fazer uma análise a toda esta situação, convém observar o trajeto do
ex-ministro e, ao que tudo indica, futuro Governador do Banco de Portugal pela
política desde 2015.
Mário
Centeno não era um nome forte do PS para as eleições de 2015, contudo
verificou-se que viria a ser um nome muito importante para o futuro das
finanças portuguesas. Centeno baseou-se numa aposta em “contas certas”, numa
redução da despesa pública (com as famosas cativações orçamentais e com um
decréscimo considerável do investimento público) e num aumento de impostos
diretos e indiretos, para fazer com que, em 4 anos, as finanças portuguesas
conseguissem respirar de uma forma mais folgada e calma. Ao contrário do que se
possa pensar, Mário Centeno não fez mudanças drásticas na linha de pensamento
de um anterior Governo de ideologia de direita conservadora e liberal
(coligação PSD-CDS), ele continuou um legado deixado por Vítor Gaspar e Maria
Luís Albuquerque. Fê-lo de uma forma mais reta e focada, mas a conjuntura
económica (e um BCE cooperativo) também permitiu que o sucesso fosse cada vez
mais uma forte possibilidade. É inegável o bem que Centeno conseguiu trazer às
finanças de Portugal, mas ficou na retina que este não era o homem ideal para
realizar reformas económicas estruturais. Essas reformas estruturais podiam trazer
ao tecido empresarial português, num cenário de pandemia mundial, uma capacidade
de gestão mais eficiente e eficaz e não tanto baseada numa atrapalhação brutal
e numa ótica de pura luta pela sobrevivência. Mas, perdoando-lhe essas falhas,
nunca conseguimos ter um Ministro das Finanças tão lúcido quanto aos seus
objetivos e tão capaz de segurar a vontade natural de aumentar a despesa
pública. Se as contas portuguesas não estivessem tão saudáveis, hoje estaríamos
numa situação bastante mais aterrorizante, e este feito devemo-lo a Mário
Centeno. Ele foi o grande obreiro. Contudo, depois de analisado o papel de
Centeno, convém analisar também a sua caminhada desde a reeleição de António
Costa como Primeiro-Ministro (PM), em Outubro, até a esta semana.
Sempre
se soube que Centeno era um trunfo enorme no baralho de Costa para vencer o
jogo que eram as eleições legislativas de 2019. Costa, muito provavelmente,
conseguiria vencê-las sem Centeno, mas António Costa não queria só vencer as
eleições, queria adquirir uma maioria absoluta e não ficar dependente de uma
esquerda pouco disposta a negociações e a dar o braço a torcer. E, para que
isso acontecesse, precisava de um Centeno forte e participativo nos comícios, e
precisava, acima de tudo, de mostrar ao eleitorado que Centeno iria fazer parte
do próximo Governo e iria liderar as finanças do país por mais 4 anos. Já na
altura a dúvida pairava sobre a longevidade de Centeno no lugar de Ministro das
Finanças, e o que é certo é que o futuro do lugar não era tão claro quanto se
queria. Mas Costa foi eleito e, apesar de não ser por mais de 50% dos votos,
foi com uma margem confortável para liderar sem grandes negociações e
contorcionismos. E, desde aí, Centeno deixou de ser a carta mais forte do
baralho de Costa. Quando surgiu o caso do Novo Banco (NB), percebeu-se
perfeitamente que a máquina de propaganda de Costa e do PS tinha mais força do
que o pensamento crítico e analista do povo português. Passarei a explicar.
Centeno, goste-se ou não, tinha razão no caso NB. As questões contratuais
obrigavam o Ministro a fazer a transferência ao NB, independentemente das
auditorias. Era isto, ponto. Mas a “opinião pública” e até o Presidente da
República puseram as garras de fora e atacaram Centeno, deixando a sua
popularidade pelas ruas da amargura. Este era o poder de Costa. Sem dizer nada,
o PM conseguiu fazer com que Centeno, aos olhos do povo, fosse dispensável e
fraco! A partir daí todos sabíamos que era uma questão de tempo até Centeno
estar fora das contas do “todo-poderoso” António Costa. É ridículo idolatrar um
Ministro das Finanças e, passados 6 meses, atacá-lo que nem um boneco. Mário
Centeno continuou a ser o mesmo Mário Centeno de sempre, só que este Centeno já
não era o Ás de trunfo do PM. A diferença estava neste pequeníssimo aspeto. E
nós, inocente eleitorado, estávamos a ser cozinhados neste caldinho saboroso, executado
com a delicadeza de uma bailarina de balé. E, quando chegados a esta semana, já
não espantava nada os ataques vindos da opinião pública (agora sim, sem aspas)
a Mário Centeno. Temos todos uma memória de peixinho, é o que é. Claro que é
notório que Centeno abandona o barco das finanças portuguesas numa das alturas
mais difíceis, e isso é criticável. Mas, que outra solução teria Centeno? A
relação com Costa, por muito que diga o contrário, já não tinha lá muito de
saudável, e Centeno só estava à espera de desenhar o Orçamento Suplementar e de
terminar o seu mandato de Presidente do Eurogrupo para dar de frosques que nem
uma patinadora olímpica. Centeno estava contrariado no Governo desde o
incidente do NB, e é preferível ter outra pessoa no lugar do Ministro das
Finanças do que ter Mário Centeno contra sua vontade. Como é óbvio este não era
o timing para o fim de um ciclo, pode o Professor Mário repetir quantas vezes
quiser que isso não será verdade. Eu sei ver ciclos, e isto não era o tempo de
terminar ciclos nenhuns. Contudo cair em cima de Centeno da forma como se fez é
digno de ser classificado como uma tareia de Sumo (aquele desporto japonês onde
só competem senhores de elevada estrutura). Aquela máquina de propaganda de
Costa não perdoa.
É
essencial para o país, agora mais do que nunca, um pensamento mais focado na
economia e não tanto no controlo orçamental, e é primordial dar mais oxigénio
ao tecido empresarial português. E, para isso, o lugar de Ministro das Finanças
vai dividir as luzes da ribalta, no Governo, com o Ministério da Economia e com
a nova figura de conselheiro de António Costa e Silva. Veremos o que o futuro
nos reserva. Contudo, a cama que foi feita a Centeno dá que pensar, se dá.
Isto é serviço público, obrigada
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